Artigo – CÚPULA DO G-20 EM ROMA E COP26 EM GLASGOW, ESCÓCIA – Por Leila Bijos

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Líderes mundiais se reúnem em duas grandes cúpulas globais na Europa: a Cúpula do G-20 em Roma, Itália, 30-31/10/2021, e a 26ª Conferência das Partes sobre Mudança Climática das Nações Unidas, ou COP26, em Glasgow, Escócia, 01-12/11/2021. A União Europeia objetiva se firmar como potência global, respaldada em resultados diplomáticos, através de determinações acatadas pelos países-membros. Os debates atuais centram-se num novo ordenamento internacional para garantir a saúde pública global e sustentabilidade, comércio e inclusão social.

No que se refere à COP26, o tópico principal centra-se na mudança climática que é prejudicial à saúde[1]. O aquecimento global, escrevem os autores, não é apenas um desastre ambiental, mas também expõe os humanos ao calor escaldante e a eventos climáticos extremos; aumenta a transmissão de doenças infecciosas; provoca o agravamento da insegurança alimentar, hídrica e financeira; colocando em risco o desenvolvimento sustentável; e acirrando a desigualdade global. Os dados do relatório de 2021 devem representar um “código vermelho para um futuro saudável”.

Nos últimos dois anos, a pandemia de coronavírus tem sido naturalmente o foco esmagador das discussões globais de saúde pública, tendo infectado 250 milhões de pessoas, matando quase 5 milhões e derrubando a economia mundial. Os efeitos da mudança climática na saúde foram mais sutis, mas implacáveis. A pandemia passará, mais cedo ou mais tarde, mas os desafios à saúde criados pelo aquecimento global vão durar décadas, até séculos. Até agora, os líderes mundiais não conseguiram resolver os desafios de saúde causados ​​pelas mudanças climáticas. Para deter e reverter essas tendências, os líderes mundiais devem aproveitar a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática em Glasgow, que começou no domingo, dia 31.10.2021, concordando em acelerar a descarbonização da economia global e fornecer mais fundos aos países de baixa renda para adaptações ao impactos do aquecimento global na saúde pública. Os impactos negativos da mudança climática são diretos e indiretos, o mais óbvio é a maior exposição da humanidade ao calor extremo, que pode ser fatal, especialmente para pessoas com mais de 65 anos e crianças menores de 1 ano. Globalmente, mortes entre pessoas mais velhas são oficialmente atribuídas ao calor, e atingiu um recorde de 345.000 em 2019, de acordo com o The Lancet, um número que é, sem dúvida, uma subestimação. O aquecimento tem atingido os países mais ricos, como atesta a extraordinária “cúpula de calor” que assolou o noroeste do Pacífico dos EUA neste verão, mas são as nações em desenvolvimento que suportam o fardo mais pesado, com os trabalhadores agrícolas impossibilitados de trabalhar. Durante 2020, Índia, Bangladesh e Paquistão perderam mais de 200 horas de trabalho por pessoa empregada devido às altas temperaturas, o que equivale a mais de cinco semanas de trabalho de 40 horas por trabalhador. Se o cidadão não cumpre com sua jornada diária, não receberá o seu salário, o que agrava a pobreza, levando a resultados de saúde com efeitos físicos e mentais, encorajando a ideação suicida e outras formas de sofrimento psicológico.

O aquecimento global sujeita os humanos a eventos climáticos extremos, insegurança alimentar e hídrica, deslocamentos e novas ameaças de doenças. Desde 2000, o risco de incêndios florestais aumentou drasticamente, expondo as populações a perigos imediatos e também aos efeitos debilitantes de longo prazo da inalação de fumaça. A incidência de desastres naturais letais como furacões também aumentou desde 2000, enquanto as secas estão aumentando em “frequência, intensidade e duração” (The Lancet). Em termos globais, 19% da superfície da Terra experimenta ciclos contínuos de seca, uma tendência que coloca em risco o acesso confiável à água e alimentos. Globalmente, os rendimentos de culturas básicas como milho, soja, trigo de inverno e arroz diminuíram em comparação com os níveis de 1980-2010. O aumento da temperatura dos oceanos e a acidificação dos oceanos também ameaçam as fontes marinhas de alimentos, das quais 3,3 bilhões de pessoas dependem para sua nutrição e subsistência, principalmente nos países em desenvolvimento. Ao todo, durante 2019, cerca de 2 bilhões de pessoas – mais de um quarto da humanidade sofreram de insegurança alimentar.

No futuro, essas tendências provavelmente gerarão um aumento repentino de “migrantes climáticos”, com consequências negativas para a saúde daqueles que foram expulsos de suas casas. Entre os mais vulneráveis ​​estão os que vivem atualmente em comunidades costeiras situadas a menos de um metro acima do nível do mar, cerca de 146,6 milhões de pessoas. Outros 400 milhões que vivem a menos de 5 metros acima do nível do mar hoje enfrentam “maiores riscos de inundações, tempestades mais intensas e salinização do solo e da água”. Em síntese, a mudança climática está aumentando a vulnerabilidade humana a certas doenças infecciosas, incluindo patógenos transmitidos pela água e arbovírus disseminados por mosquitos, carrapatos e artrópodes. Graças às temperaturas globais mais altas, mobilidade e urbanização, a incidência da dengue, uma doença viral transmitida por mosquitos, dobrou a cada década desde 1990. O aquecimento global também aumentou a área geográfica de Plasmodium falciparum, a espécie mais letal do parasita causador da malária, inclusive em áreas montanhosas que antes estavam fora de seu alcance. Temperaturas mais altas e mudanças na salinidade superficial das águas costeiras criaram condições mais favoráveis ​​para a transmissão da bactéria responsável pela cólera e outras doenças que se espalham pela água.

As discussões sobre mudanças climáticas na COP26 em Glasgow traduzem o pessimismo nas propostas de redução de gases estufa, principalmente no que concerne à China e Estados Unidos da América, uma vez que o aumento de temperatura precisa ser reduzido para 1,5° -C, o que implica em desafios e promessas.

Site: Queimadas no Brasil. Google.com

Deve-se acelerar a bioenergia e outras fontes renováveis como energia solar ou energia eólica, matrizes energéticas indispensáveis, que requerem projetos de longa duração e recursos financeiros público-privados. O Brasil, em 2021, viu-se impactado pelas queimadas e seca prolongada em todo país, o que comprometeu as usinas hidrelétricas, levando o governo a comprar de 2,3 bilhões de energia da Argentina.

A segurança dos países hemisféricos vem sido colocada em xeque, principalmente a respeito da exploração da Região Amazônia, voltada para soluções inovadoras e factíveis. Indaga-se a respeito do real objetivo da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), e os compromissos firmados pelos oito países que assinaram o Tratado Amazônico, objetivando ações conjuntas de políticas públicas, visando a debelar as agressões sofridas pela floresta, fortalecer os povos indígenas e ribeirinhos, dirimir as desigualdades sociais, elevar os padrões de trabalho e renda.  

Evidencia-se uma crise ambiental em nível internacional, com críticas ácidas ao Brasil, que detém 60% da Amazônia, com uma floresta tropical de dimensões continentais, que atua como um indelével sumidouro de carbono e um regulador crítico de temperatura, com uma fonte de água doce importante para todo o planeta.

A defesa do bioma amazônico precisa ser colocada na pauta de discussão internacional como um dos problemas mais urgentes da atualidade, viabilizando alternativas para o desenvolvimento da região com soluções de políticas públicas e regionais. Sem abdicar de uma análise integradora, identitária e cultural, que pontue novas atividades extrativistas, como a piscicultura, a pecuária, a agricultura familiar, novas tecnologias que gerem riqueza, numa cooperação internacional que coadune acordos e tratativas entre o Brasil, Bolívia, Chile, Equador, Colômbia, Peru, e países desenvolvidos, verdadeiramente compromissados com um projeto para a Amazônia no Século XXI. Urge pensar a Amazônia como um lócus de poder, dotada de um sistema hidrográfico que evidencie sua grandeza e importância estratégica, onde são gerados 70% do PIB dos cinco países que o integram e vivem cerca de 50% da população, com redes sociais organizadas, que se articulam numa teia de preservação, defesa e sustentabilidade. Soluções que perpassem para a contenção dos fluxos migratórios, as invasões de espaços estagnados para o extrativismo, biopirataria, o narcotráfico utilizado por atores extra regionais, que agem sub-repticiamente com seus ilícitos, e aproveitam a ausência da vigilância de fronteiras para desenvolverem plantações de maconha, refino da coca, atuação de máfias que atuam em rede com tráfico de entorpecentes, inserindo-se em polos rurais com baixa densidade de vigilância estatal. 

A análise dos ciclos na Amazônia, seus momentos históricos nos conduzem à possibilidade de plantio do algodão, da abertura da navegação dos rios, e do sonho de criação da Hileia Amazônica pela UNESCO, com propostas de navegação dos Rios Amazônicos em partes infrutíferas, que não projetaram os reais instrumentos do Pan-Multiculturalismo, e nem traçaram um Programa Amazônia Protegida que cobrisse toda a sua dimensão. Os desafios que se interpõem estão fundados no presente, em que todos os países latino-americanos se unam para modificar um padrão de desenvolvimento que não se baseie na contínua incorporação de terra e de recursos naturais, espelhados no passado como infinitos, mas com uma economia de fronteira uníssona, que preserve as fabulosas riquezas naturais, o saber de suas populações tradicionais, o conhecimento secular de povos que habitam o trópico úmido e respeitam o bioma.  

Esforços conjuntos e desenvolvimento de capacidades proporcionarão um novo olhar para a Região Amazônica, com independência, energia elétrica, fibras óticas, novas tecnologias de comunicação, com interação, monitoramento e vídeos para conferências e discussões dos problemas contemporâneos. Faz-se mister um olhar atento para a malha hidrográfica, com a Bacia Platina e Amazônica, que figuram entre as maiores e mais importantes do mundo, com uma área estimada em 3,1 milhões de km² (equivalente a 17% da superfície da América do Sul), sendo considerada a segunda maior do subcontinente e a quarta do mundo, abrangendo os territórios de cinco países, sendo que a maior parte de sua área encontra-se no Brasil (1.415.000 km²), seguido por Argentina (920.000 km²), Paraguai (410.000 km²), Bolívia (205.000 km²) e Uruguai (150.000 km²). O principal rio da Bacia do Prata é o Paraná, com 3.780 km, acompanhado de seus afluentes: o Paraguai, com 2.920 km, e o Uruguai, com 1.600 km. Todos três nascem em território brasileiro. Inserem-se nesse contexto o desenvolvimento educacional, o suporte ao judiciário, o fortalecimento da Zona Franca de Manaus, a implantação de ZPEs, com o Exército atuando com galhardia numa região que demonstra ser um espaço sensível não apenas para os países que o compõem, mas, para o equilíbrio de poder na América do Sul.

Pensar a Amazônia, com soluções customizadas, com uma geopolítica de integração, com inserção, sem preconceito, sem discriminação, balizada num contexto de Direito Internacional, é pensar na grandeza e importância estratégica de uma região que abriga a rede fluvial mais extensa do planeta.

Urge conclamar as nações a investirem em adaptações climáticas relacionadas à saúde; vincular seus esforços de mitigação às prioridades globais de saúde; acelerar a transição para uma economia mundial pós-carbono; e expandir o engajamento público e privado para reduzir as desigualdades globais na saúde exacerbadas pelas mudanças climáticas.


[1] Relatório anual “Countdown” do The Lancet, publicado em outubro/2021, por uma equipe de quase 100 cientistas de 43 instituições ao redor do mundo. Site: https://www.thelancet.com/countdown-health-climate.