Um Artigo por Embaixador Qais Shqair, Chefe da Missão da Liga dos Estados Árabes no Brasil.
Em 1945, a Organização das Nações Unidas (ONU) foi oficialmente estabelecida para suceder a Liga das Nações, que havia falhado em prevenir as duas guerras mundiais. Desde então, muitos Estados correram para se tornar membros logo após a obtenção da independência, depositando suas esperanças na proteção de sua soberania à luz de uma tendência internacional de promover a paz mundial com a criação da ONU.
Foi durante o mandato de seu segundo Secretário-Geral, Dag Hammarskjöld (1953-1961), que a primeira missão de paz foi implantada, em 1956, no Egito e no Congo, simbolizando o papel da ONU em manter a paz mundial.
Em 17 de setembro de 1948, o mediador da ONU para a Palestina, Conde Folke Bernadotte, foi assassinado pela organização militante sionista “Stern”, após o plano de partilha da ONU estabelecido na resolução no 181 da Assembleia Geral em novembro de 1947. Esse assassinato foi inicialmente parte de campanhas direcionadas à organização ao longo de décadas de suas missões em diferentes partes geográficas.
A ONU e suas instituições especializadas têm sido criticadas por falharem em impedir o surgimento de grandes guerras e conflitos (como as duas Guerras do Golfo; 1991 e 2003). A ONU tem sido culpada por não conseguir obrigar Israel a cumprir suas resoluções. De fato, até o momento, Israel não deu atenção à implementação de nenhuma das dezenas de resoluções da ONU relacionadas ao conflito palestino, começando pela resolução 181, que propunha a solução de dois Estados na Palestina.
Os padrões duplos e as respostas insuficientes às crises humanitárias lideram a lista de críticas dirigidas às missões da ONU em todo o mundo. É compreendido que certos Estados são os responsáveis por essa abordagem de duplo padrão em suas políticas multilaterais, refletindo interesses políticos e econômicos divergentes.
Enquanto Israel atualmente discute a proibição das atividades da UNRWA, a Assembleia Geral e o Conselho de Segurança têm sido, recentemente, palco de ataques de Israel contra a organização; suas instituições, funcionários e até o Secretário-Geral, Sr. António Guterres. Após o pedido do Representante Permanente de Israel na ONU para que Guterres renunciasse e que a organização fosse fechada, ao rasgar sua carta em uma sessão oficial, o Ministro das Relações Exteriores de Israel, algumas semanas atrás, declarou o Sr. Guterres “persona non grata”, impedindo-o de entrar em Israel.
Essa declaração é uma violação flagrante do direito internacional que rege a missão, os funcionários e os altos funcionários da ONU. No nível bilateral, os Estados costumam recorrer a protestos diplomáticos contra as políticas, especificamente contra o comportamento hostil de um enviado diplomático de outro Estado, declarando-o “persona non grata”.
Obviamente, esse procedimento não pode e não deve ser aplicado ao Secretário-Geral da ONU. Isso vai muito além do mandato das relações bilaterais entre os Estados. A decisão de Israel é, de fato, um insulto pessoal ao Secretário-Geral e à organização que ele representa. Pode até ser vista como uma humilhação aos Estados membros da ONU em geral.
Assim, Israel está se isolando, à medida que se espera, a qualquer momento, que o Tribunal Penal Internacional emita um mandado de prisão contra seu Primeiro-Ministro e o Ministro da Defesa.
Diante disso, a ONU é capaz de se defender? Qualquer resposta possível deve levar em conta que a organização é meramente uma plataforma para seus Estados membros. É onde os principais países, em particular, refletem sua vontade e promovem seus interesses e políticas.
Infelizmente, poucos países, até agora, rejeitaram a decisão de Israel de atacar o Secretário-Geral da ONU. É hora de os Estados membros, especialmente os que têm poder de veto, defenderem o Sr. Guterres pessoalmente, bem como a organização que representa 193 Estados membros.
Em conclusão, parece que a resposta certa para a questão de se a ONU pode se defender é fazer uma pergunta legítima sobre se os Estados membros têm a intenção de defender a ONU. Outras perguntas hipotética pode surgir: se Israel declarou o Secretário-Geral “persona non grata”, não sendo bem-vindo em Israel, a Assembleia Geral da ONU, com base na reciprocidade, faria o mesmo, declarando o Representante Permanente de Israel na ONU “persona non grata” e barrando sua entrada nas suas instalações? Da mesma forma, os Estados-membros da ONU permaneceriam unidos para defender o topo da ONU, a UNIFIL, no sul do Líbano?