O físico britânico Stephen Hawking morreu durante a madrugada desta quarta-feira na sua casa em Cambridge, aos 76 anos. Hawking, um dos mais prestigiados nomes da ciência, revolucionou os estudos sobre os buracos negros, nunca deixando de se indagar sobre a origem do Universo, desafiava os próprios limites da vida humana.
Aos 21 anos, foi-lhe dito que sofria de esclerose lateral amiotrófica (também conhecida como a doença de Lou Gehrig) e que teria menos de três anos de vida pela frente. A doença veio gradualmente, ao ponto de conseguir mexer pouco mais do que um dedo e piscar os olhos, mas o físico fintou o diagnóstico pessimista: com a ajuda de uma cadeira de rodas e de um sintetizador de voz, ultrapassou em quase cinco décadas o tempo de vida que lhe era dado — sem nunca deixar de participar na comunidade científica.
“Vivi sob o espectro de uma morte precoce durante os últimos 49 anos. Não tenho medo da morte, mas não tenho pressa de morrer. Há tanta coisa que quero fazer primeiro”, dizia ao Guardian em 2011, recusando a ideia de uma vida para além da morte — era “um conto de fadas para pessoas com medo da escuridão”.
Stephen Hawking nasceu em Oxford a 8 de Janeiro de 1942 – precisamente 300 anos depois da morte de Galileu Galilei, como gostava de mencionar – e morreu a 14 de Março deste ano – no dia do nascimento de Albert Einstein.
“Estamos profundamente entristecidos pela morte do nosso pai”, lê-se num comunicado assinado por Lucy, Robert e Tim Hawking, filhos do cientista casado duas vezes, e divulgado esta madrugada. “Foi um grande cientista e um homem extraordinário cujo trabalho e legado sobreviverá durante muitos anos”, é dito na missiva dos filhos citada pelo The Guardian. “A sua coragem e persistência, com a sua inteligência e humor, inspiraram pessoas no mundo inteiro. Ele disse um dia: ‘Isto não seria um grande Universo se não morassem lá as pessoas que amamos’. Vamos sentir a sua falta para sempre.”
Impossibilitado de dar uso às suas cordas vocais, Stephen Hawking continuava a ser ouvido. Uma característica distintiva era o som da sua voz robótica, produzida por um sintetizador de voz; as letras ou palavras surgiam na tela do computador integrado na cadeira de rodas e Hawking escolhia quais queria dizer, através de um movimento .
As limitações físicas não travaram o seu espírito aventureiro. Viajou pelo mundo (até foi à Antárctica), espalhando conhecimento à sua passagem, quando fez 60 anos, decidiu celebrá-los num balão de ar quente; passados cinco anos, participou num voo de gravidade zero. Poucos minutos antes da viagem, o cientista dizia estar entusiasmado com a possibilidade de “flutuar livremente no espaço” depois de tanto tempo “confinado a uma cadeira de rodas
A sua vontade de superar as adversidades, aliada à sua mente brilhante, fez com que se tornasse no mais famoso cientista do mundo desde Albert Einstein.
Uma vida dedicada aos misteriosos buracos negros
Hawking dedicou a sua vida a tentar deslindar os mistérios do Universo, procurando conhecer os seus mecanismos e a forma como tudo começou. O seu objetivo, dizia, era “simples”: queria “um entendimento completo do Universo, da razão pela qual existe e pela qual existe sequer”. Destacou-se pelo seu trabalho na astrofísica, sobretudo no campo dos buracos negros e da relatividade, bem como pela divulgação científica, sendo autor do bestseller Uma Breve História do Tempo: do Big Bang aos Buracos Negros. Escrevia com “humildade e humor”, como se lê no seu site, que tem como fundo uma imagem do espaço captada pelo telescópio espacial Hubble.
Apesar de todos os contributos de Hawkings, os buracos negros continuam a estar envoltos em mistério. Com base nos teoremas do cientista britânico, que combinavam as leis da mecânica quântica e da relatividade geral, chegou-se à radiação de Hawking, que é um tipo de emissão libertada pelos buracos negros conforme se vão evaporando até se tornarem em nada.
Foi esta ideia que o tornou famoso no meio científico: afinal, os buracos negros emitiam radiação, quando se pensava que se limitavam a “engolir” tudo (como são densos e maciços, nada escapa à sua gravidade, nem mesmo a luz). Em 2002, Stephen Hawking disse que queria que a fórmula da entropia dos buracos negros (também conhecida como a fórmula de Hawking) fosse gravada na sua lápide.
A sua tese de doutoramento (intitulada Propriedades dos Universos em Expansão), escrita em 1966 quando ainda estudava na Universidade de Cambridge, foi divulgada pela primeira vez no ano passado. “Ao tornar livre o acesso à minha tese, espero inspirar pessoas em todo o mundo a olhar para cima, para as estrelas, e não para baixo, para os seus pés”, dizia Stephen Hawking. Em menos de 24 horas, houve quase 60 mil downloads da tese, informava a Universidade de Cambridge, que considerou tratar-se de um documento “histórico”.
O britânico argumentava que viajar no tempo é teoreticamente possível, e não punha de parte a possibilidade de um cataclismo vir, “mais tarde ou mais cedo”, a limpar a humanidade da face da Terra — fosse ele uma guerra nuclear, um vírus ou “outros perigos em que nem sequer pensámos ainda”. Daí, dizia ser imperativo que nos lançássemos ao espaço o quanto antes — mas, para isso, era preciso conhecê-lo.
Pela sua história de vida e exímio intelecto, o britânico tornou-se um dos cientistas mais reconhecidos pelo grande público, participando mesmo em diversas séries televisivas como Os Simpsons ou A Teoria do Big Bang. Em 2014, a sua história de vida foi adaptada ao cinema em A Teoria de Tudo, filme que valeu um Óscar de Melhor Ator a Eddie Redmayne. “O problema da minha fama é que não posso ir a lado nenhum sem ser reconhecido. Não me basta pôr uns óculos de sol e uma peruca, a cadeira de rodas denuncia-me”, brincou, numa entrevista a uma televisão israelita em 2006.