Hoje é dia do diplomata e o nosso site republica uma parte da entrevista com a diplomata brasileira Claudia Assaf

Em homenagem ao” Dia do Diplomata”o Brasília in Foco decidiu republicar a entrevista com a diplomata brasileira, Claudia Assaf. Claudia além de diplomata por carreira é uma comunicadora nata e um exemplo de empoderamento feminino em um meio profissional onde a maioria dos diplomatas brasileiros são do sexo masculino.

Claudia Assaf nasceu no Rio de Janeiro em 1971. Estudou a língua árabe clássica no instituto de língua árabe para estrangeiros vinculado à Universidade de Damasco, na Síria, nos anos de 1993 e 1994. Ingressou na carreira diplomática em 2006. Mestre em Diplomacia pelo Instituto Rio Branco, graduada em Bacharel em Matemática e Relações Internacionais, a diplomata Claudia Assaf serviu nas Embaixadas do Brasil em Doha, no Estado do Catar, na Missão do Brasil junto às Nações Unidas em Nova York, na Embaixada do Brasil em Riade, no Reino da Arábia Saudita. Atualmente trabalha na  embaixada do Brasil no Kuwait, cumulativa com o Reino do Bahrein. Em 2013, fundou a consultoria Dicas da Diplomata, pela qual oferece, em bases voluntárias, orientações diversas a aspirantes à carreira de diplomata pela fanpage homônima no Facebook e comenta redações de forma personalizada. É autora de Diário de Bordo – um voo com destino à carreira diplomática, com mais de três mil exemplares vendidos. Em 2017, abriu nova dimensão do canal Dicas da Diplomata, o Dicas da Diplomata & Árabe, tanto no Facebook quanto no YouTube.

Por gentileza, explique aos nossos leitores sobre como aprendeu a língua árabe e outros aspectos de sua vida e carreira.
Faço parte da segunda geração de sírios. Meus avós maternos chegaram ao Brasil em 1926, separadamente, procedentes de Sueida, província síria localizada ao sul de Damasco. Analfabetos, vieram “fazer a América”, como se dizia naquela época. Eram cristãos ortodoxos. Nunca mais regressaram à Síria. A viagem para o Brasil não foi fácil. Levaram cerca de 30 dias. Minha avô veio acompanhada de um tio, transitaram em Gênova. Meu avô transitou por Marselha. No Brasil, casaram-se. eram primos. Tiveram treze filhos, mas, naquela ocasião, nascia e em seguida morria. Vingaram apenas seis meninas, Farha (1932-2011), Salima (1936), Carmelia (1938), Maria (1939), Sahda (1941) e Aida (1943). Salima é minha mãe. Costumo brincar que tenho seis mães. As seis irmãs sofreram severo bullyng na escola. Debochavam do modo como falavam. Elas proferiam palavras em árabe sem saber o que era português e o que era árabe. Muito pobres, sua rotina era estudar apenas. Embora analfabetos, meus avós, inexplicavelmente, valorizavam demasiadamente os estudos. Assim, não lhes era permitido faltar a escola. Meu avô era mascate, vendia de porta em porta. Os imigrantes que já estavam no Brasil ajudavam os recém chegados e assim sucessivamente. Em casa, apenas não faltava comida, o resto tudo era o necessário para sobreviverem. Até o caderno era feito por minha avó, com papel de embrulhar pão. Conforme se formaram na então denominada Escola Normal, as seis irmãs, cada qual a seu tempo, iam tornando-se professoras, quando passavam a sustentar a casa dos pais. Antes disso, ainda adolescentes, todas as seis irmãs trabalhavam em uma fábrica de plantas ornamentais de plástico. Passavam o dia fazendo arranjos de flores após a escola.
Nós, netos, segunda geração, já tivemos outros privilégios. Não precisávamos trabalhar para sustentar ninguém. Embora eu estudasse em escolas públicas, fazia aulas extracurriculáres no bairro onde morávamos, em Vista Alegre, subúrbio do Rio de Janeiro. Eu, por exemplo, estudava piano com a vizinha, que era professora, e inglês em um cursinho da esquina. Durante minha infância e adolescência, a língua de meus avós me intrigava: não entendia nada. Minha mãe e minhas tias conversavam com os pais em “portuárabe”, misturando tudo. Uma confusão.
Quando ingressei na UFRJ, com 17 anos, curso de Bacharel em Matemática, comecei a ter maior curiosidade em aprender o idioma de meus avós. A vontade foi ficando muito forte. A Faculdade de Lertas da UFRJ ficava no mesmo campus da Faculdade de Matemática, então comecei a frequentar as cadeiras de Letras, habilitação Português-Árabe. Fiquei fascinada. Sentenciei a mim mesma: um dia vou falar fluentemente.
Ocorre que a formatura na Matemática e a entrada na “vida real” levaram-me a obter emprego em multinacional e o sonho pelo aprendizado do idioma árabe foi ficando cada vez mais para trás. Já empregada na IBM-Brasil como Analista de Sistemas, recém-formada, vendo o sonho de falar árabe fluentemente ficando para trás com as novas responsabilidades da vida adulta, um dia, mais por desencargo de consciência, fui investigar no então Consulado da Síria em Copacabana, hoje fechado, se haveria algum curso de árabe curto, mas intensivo, para fazer nas férias. Era 1992. Fiz minha inscrição pleiteando uma espécie de bolsa de estudos e, um ano depois, fui contemplada, quando nem mais me lembrava do assunto. O curso que me ofereceram foi de dois anos de duração no instituto de língua árabe para estrangeiros, vinculado à Universidade de Damasco. Decidi agarrar essa oportunidade e pedi demissão da IBM. Os amigos e os familiares me chamavam de doida, deixar um empregaço para trás, nova, para ir em busca da fluência em uma língua que supostamente em nada me ajudaria na carreira. Hoje, como diplomata, ela é meu grande diferencial na carreira.
Eu conto como foi minha vida de estudante na Síria no meu livro “Diário-de Bordo – Um voo com destino à carreira diplomática”(mais informações sobre a obra acessar www.caudiaassafdiariodebordo.com.br. Na obra eu também conto como e por que decidi ingressar na carreira de diplomata). Mas resumindo: conheci na Síria um novo mundo, pessoas maravilhosas, uma transformação de visão de mundo, o etnocentrismo, que nem sabia que tinha – normlmente os etnocêntricos não sabem que existem outras culturas – desabou, afinal, até então, mal havia saído do Rio de Janeiro. Na Síria, pude pegar a fluência tão sonhada na língua árabe. Findo o curso, ingressei na aviação, nos Emirados Árabes e no Bahrain, trabalhando por cerca de oito anos em uma empresa aérea árabe, o que me permitiu consolidar o idioma árabe. Conto toda essa história também no meu vídeo disponível no meu canal do YouTube “Dicas da Diplomata e Árabe”, em https://www.youtube.com/watch?v=ro-kMqCuMds
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Fabiana Ceyhan

Jornalista por formação, Professora de Inglês (TEFL, Teaching English as a Foreigner Language). Estudou Media Studies na Goldsmiths University Of London e tem vasta experiência como Jornalista da área internacional, tradutora e professora de Inglês. Poliglota, já acompanhou a visita de vários presidentes estrangeiros ao Brasil. Morou e trabalhou 15 anos fora do país.