Artigo – Covax poderia atribuir prioridade ao Brasil – Por Pacco Brito

Numa verdadeira aula prática de realpolitik aplicada, no mundo ocidental –  onde se tecem sempre loas aos direitos humanos, entre os quais se inclui a distribuição equitativa das vacinas contra a Covid-19-, instalou-se um verdadeiro faroeste na defesa crua da filosofia da farinha pouca, meu pirão primeiro.

Na acirrada disputa global por vacinas, no Consórcio Interestadual do Desenvolvimento do Brasil Central – cuja presidência em 2021 cabe governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, e a mim sua secretaria-executiva – iniciamos tratativas com fabricantes internacionais, com vistas à aquisição de imunizantes.

Nossa atuação, nessa área, complementa à do Governo Federal.  Nosso objetivo é a de, ao ampliar a oferta interna de imunizantes, assegurar a vacinação plena dos 26 milhões de habitantes das sete unidades da Federação que integram o Consórcio (Distrito Federal, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Tocantins)

Temos, os sete governos, feito um hercúleo esforço para proteger nossa população contra os efeitos devastadores da pandemia. Parece claro, contudo, que a escalada dos gigantescos danos humanos e materiais provocados pelo SARS-Cov-2 – só será interrompida com a vacinação da vasta maioria da população brasileira.

Com o propósito de ampliar a oferta interna de vacinas – não apenas para o Brasil Central, mas para todo o Brasil – o Consórcio tem buscado sensibilizar o Governo Federal para a conveniência de realizar gestões internacionais, em particular junto à Organização Mundial da Saúde e aos membros do consórcio do COVAX Facility.

O COVAX é um consórcio do qual fazem parte países de renda alta e média-alta, o Brasil inclusive, que juntaram recursos para comprar vacinas em conjunto, quando elas ainda estavam na fase de pesquisa, para distribuição a países mais pobres. O Brasil aderiu à iniciativa como comprador.

Nessas gestões, devemos reiterar plena adesão ao princípio humanitário de distribuição equitativa de vacinas anti-Covid19, que é preconizado pelo COVAX. Ponderamos, contudo, que o cronograma de sua distribuição não deveria valorizar excessivamente o aspecto da renda (ou do PIB per capita).  Se o objetivo a ser alcançado é a erradicação global da pandemia, parece razoável que prioridade seja atribuída à distribuição de vacinas a países ou regiões em que se verifique excepcional severidade de contágio.

Efetivamente, não nos parece razoável, em termos do controle global da pandemia, que 14 países das Américas – que registram 48% das fatalidades relacionadas à Covid-19 em todo o mundo –  tenham recebido apenas 8% das vacinas até o momento distribuídas pelo COVAX.  Ao mesmo tempo, regiões como a África e o Sudeste Asiático, onde o número de infectados pelo Covid-19 é substancialmente menor, receberam 79% das vacinas distribuídas pelo COVAX.

O caso específico do Brasil reveste-se de particular dramaticidade. Nosso país representa o foco ativo de Covid-19 mais agressivo de todo o mundo, com o número de mortes diárias tendo já ultrapassado a média de três mil pessoas. Não desmerecemos as necessidades de países mais pobres do que o Brasil, mas não podemos ficar imobilizados quando registramos as grandes quantidades de vacinas estão sendo destinadas a países cuja situação diante do Covid-19 é incomparavelmente menos grave do que a do Brasil e de outros países da América Latina e Caribe. Essa é uma ideia que compartilhamos com aprópria Organização Panamericana de Saúde (OPAS).

Talvez possa ser negociado, no âmbito do COVAX, entendimento que ofereça em troca da antecipação de vacinas para atender à emergência brasileira, o fornecimento posterior de vacinas, importadas ou produzidas no Brasil, não só para repor o “empréstimo’” que venha a ser feito pelo COVAX, mas até uma doação de doses para países de renda baixa.

Paco Britto é o Secretário-Executivo do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento do Brasil Central e Vice-Governador do Distrito Federal.

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Pedro Luiz Rodrigues

Pedro Luiz Rodrigues, diplomata e jornalista. Como diplomata serviu em Bangladesh, Washington, Assunção, Buenos Aires e Tel-Aviv. Ministro-Conselheiro em Paris. Foi embaixador na Nigéria, Benim, Níger e Chade. Foi da editoria de economia do JB e Estado de SP (do qual foi diretor em Brasília). Foi subsecretário e Secretário de Imprensa da Presidência da República (períodos Tancredo Neves, Sarney e Collor de Melo), do Ministério da Fazenda (ministros Galvêas, Marcílio Marques Moreira e Pedro Malan). Chefe de Gabinete do Ministro da Justiça José Carlos Dias. Diretor de Relações Internacionais do Senado Federal. Diretor de Comunicação da FEBRABAN. Sócio da Flecha de Lima Relações institucionais.