O Embaixador da Argélia no Brasil nos concedeu uma Entrevista e explicou muito sobre o país.

 Entrevista com o Embaixador TOUFIK DAHMANI  Concedida á Fabiana Ceyhan:

APRESENTAÇÃO DO PAÍS

Nome oficial: República Argelina Democrática e Popular

Forma de Governo: Presidencial

Chefe de Estado: Abdelaziz Bouteflika

Chefe do Governo: Ahmed Ouyahia

Dados geográficos

Área: 2.381.740 km², dos quais 84% de deserto

Capital: Argel (4,4 milhões de habitantes)

Principais cidades : Oran, Constantine, Annaba, Tlemcen, Setif

Língua (s) oficial (is): Árabe clássico, Tamazight (língua nacional)

Idioma (s) comum (s): dialeto árabe, francês, línguas berberes

Moeda: Dinar argelino (DA)

Dia Nacional: 1º de novembro (aniversário do início da Guerra da Independência)

Dados econômicos

PIB: US $ 161 bilhões (2016)

PIB / capita. : US $ 3952 (2016)

Taxa de crescimento: 3,7% (2016)

Taxa de desemprego: 10,5% da população ativa (setembro de 2016)

Taxa de inflação: 6,4% (2016)

Dívida pública: 8,8%

Dívida externa: 2,7% PIB

Balança comercial: – 23,1 bilhões de euros (2016)

Principais clientes: Espanha (17,37%), Itália (16,32%), França (13,02%), Reino Unido (7,63%), Holanda (6,04%) – (2016)

Principais fornecedores: China (15,97%), França (10,52%), Itália (9,37%), Espanha (7,64%), Alemanha (6,57%) – (2016)

Participação dos principais setores de atividade no PIB (2016):

̵ Hidrocarbonetos: 29% (94% das exportações, 47% da receita do Estado)

̵ Agricultura: 11%

– Construção: 11%

̵ Serviços: 44%

̵ Indústria: 5%

Exportações da Argélia para o Brasil (2015): 6,21 bilhões de euros

Importações da Argélia para o Brasil (2015): 3,89 bilhões de euros

Dados demográficos

População: 41 milhões de habitantes (2017)

Densidade: 15,88 hab / km² ; 56% da população em 3% do território

Crescimento populacional: 2,03%

Expectativa de vida: 77,2 anos

Alfabetização: 78%

Religião: Islã sunita, cristãos, judeus.

IDH: 83º no mundo.

 

 

  • Honorável Senhor, por gentileza explique aos nossos leitores sobre a Argélia, população, geografia, e dados importantes da economia.

 

 

País do norte da África limitado pelo mar Mediterrâneo, a Argélia faz fronteira com o Marrocos ao oeste, o Sara Ocidental, a Mauritânia e o Mali ao sudoeste, o Níger ao Sudeste, a Líbia e a Tunísia ao leste. O deserto do Saara representa 84% do seu território que se estende por 2.381.740 km².

 

Terceira maior economia da região do Oriente Médio e da África do Norte (MENA) e locomotiva do Magrebe, a Argélia faz parte de alguns dos poucos países que conseguiram reduzir a pobreza em 20% em 20 anos. O governo argelino realmente tomou medidas significativas para melhorar o bem-estar dos seus cidadãos através da implantação de políticas sociais de acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. A Argélia liquidou sua dívida, investiu em projetos de infra-estrutura e melhorou seus indicadores de desenvolvimento humano.

 

A Argélia fez progressos notáveis em cada um dos principais indicadores do desenvolvimento humano. Classificada na 83ª posição, de 188 países, no último Relatório de Desenvolvimento Humano do PNUD, junta-se à coorte de países com alto nível de desenvolvimento humano. A expectativa de vida no nascimento aumentou 16,6 anos e a duração média da escolaridade foi de 5,8 anos. Com uma taxa líquida de escolaridade escolar primária de 97% em 2015 (e paridade entre meninas e meninos), o país atingiu o objetivo da escolaridade universal – sabendo que também possui uma alta taxa de educação superior.

 

Na frente econômica, apesar do colapso dos preços do petróleo e das condições climáticas desfavoráveis, a Argélia conseguiu manter uma taxa de crescimento de 3,7% em 2016.

 

Poder executivo: o Presidente da República é o chefe de Estado. Ele é eleito por sufrágio universal direto por 5 anos (por um máximo de dois mandatos consecutivos). Ele nomeia o primeiro-ministro e seu governo sob proposta do primeiro-ministro. O presidente também terá que consultar o parlamento para escolher o primeiro-ministro.

 

Poder legislativo: o parlamento é composto pelo Conselho da Nação (senadores) e pela Assembleia Popular Nacional (deputados). Os senadores são eleitos por sufrágio universal indireto por 6 anos (renovável a cada 3 anos). Os deputados são eleitos por sufrágio universal direto por 5 anos. Eles revisam sucessivamente projetos e propostas, leis de voto e controlam o governo.

Para a atual legislatura (2017-2022), 54 partidos participaram das eleições e cerca de 30 deles possuem deputados. Desde 2012, a lei exigiu que os partidos políticos reservem 30% de suas listas eleitorais para as mulheres.

 

A Argélia é dividida em 48 wilayas (departamentos) liderados por walis (prefeitos). Cada wilaya é dividida em Dairas, elas mesmas divididas em comunas. Cada wilaya e comuna é dirigida por uma assembléia eleita, designada como a Assembléia Popular de wilaya e a Assembléia Popular Municipal.

 

A Argélia tem mais de quarenta jornais diários, publicados em francês e árabe. Eles são publicados em quase um milhão e meio de cópias por dia. Possui uma dúzia de canais de televisão privados, além de canais audiovisuais públicos.

 

A Argélia, desde a sua independência em 1962, optou por uma política externa cujos princípios doutrinários irrevogáveis são a soberania dos Estados e o seu direito à autodeterminação, a não interferência nos assuntos internos dos Estados, a solução pacífica dos conflitos, boa vizinhança e não-intervencionismo, seja militar ou humanitário.

 

A Argélia sempre lutou por uma ordem internacional que defende a soberania dos Estados e seu direito à autodeterminação. Nesse sentido, mobilizou sua diplomacia para levar a voz dos movimentos de libertação para todos no mundo (África, Ásia, América Latina …) e foi promotor dos direitos de países em desenvolvimento apoiando nos vários círculos internacionais princípios de autodeterminação, respeito pelas fronteiras herdadas de divisões coloniais e não interferência nos assuntos internos dos países. Sua luta pela independência produziu uma política externa intransigente em relação a qualquer interferência estrangeira.

 

 

  • Quais os projetos de cooperação entre o Brasil e a Argélia e quantos anos de relações diplomáticas entre os 2 países.

 

 

As relações políticas entre a Argélia e o Brasil são excelentes. O Brasil foi um dos primeiros países a abrir uma embaixada na Argélia em 1962. As obras do grande arquiteto brasileiro Oscar Neimeyer na Argélia também testemunham os laços de amizade entre nossos dois países.

 

Durante o período do regime militar, a Argélia acolheu muitos refugiados brasileiros que fugiram da perseguição do regime, incluindo o ex-governador de Pernambubo e grande figura de militância naquela época, Miguel Arraes, que morou na Argélia durante 14 anos (1965-1979).

 

Na década de 1980, houve uma recuperação nas relações argelino-brasileiras, que culminou em duas visitas de estado, a primeira em 1983 do Presidente brasileiro João Figueiredo, seguida de uma visita de retorno do presidente Chadli Bendjedid.

 

Durante este período, a assinatura de vários acordos que estabelecem o quadro legal para a cooperação bilateral deve ser destacada: Acordo de Cooperação Econômica, Comercial, Científica, Tecnológica, Técnica e Cultural (1981); Acordo que estabelece um comitê conjunto argelino-brasileiro (1981), Acordo Comercial (1981) ou o Acordo de Cooperação Econômica (1985). A primeira sessão da Grande Comissão Mista foi realizada em Argel em 1987.

 

No entanto, na década de 1990, as relações bilaterais foram um pouco letárgicas. Isso até o presidente Lula da Silva chegar. Os Presidentes Bouteflika e Lula deram um grande impulso às relações bilaterais. Os dois chefes de Estado decidiram traduzir a amizade e simpatia que unem os dois países em projetos de cooperação.

 

A visita do Presidente Bouteflika ao Brasil em 2005 e a visita do Presidente Lula à Argélia em 2006 iniciaram uma nova dinâmica destinada a construir um relacionamento exemplar no contexto da cooperação Sul-Sul. Várias missões técnicas, empresários e decisores políticos e autoridades foram realizadas para acompanhar as decisões tomadas pelos presidentes. Projetos de cooperação foram acordados em setores como energia, saúde, agricultura, artesanato, recursos hídricos, entre outros.

 

Além disso, os dois países possuem muitas convergências de pontos de vista sobre todas as questões regionais e internacionais, como as crises na Síria, na Líbia e no Mali. Eles defendem conjuntamente o multilateralismo e o diálogo político como meio de resolução de conflitos em vez de intervenções estrangeiras.

 

O meu prazer é multiplicado por dez pois tenho a oportunidade de recordar, aqui, como os povos argelinos e brasileiros, embora vivam em países muito distantes uns dos outros, se sentem mais do que nunca vinculados por suas aspirações e esperanças por um mundo melhor. A solidariedade inestimável liga os dois povos através de décadas. Uma solidariedade, mais do que nunca indispensável, para enfrentar os desafios do nosso século.

 

Os laços que unem nossos dois povos são bem mais velhos e datam de bem antes da Independência da Argélia em 1962. De fato, desde a época da “Regência de Argel” ou do reinado de Emir Abdelkader, estadista e grande figura argelina, que laços diplomáticos, humanos e sociais ligavam os dois países.

 

Neste contexto, permito lembrar a existência de trocas de cartas, fotos ou documentos entre Emir Abdel Kader e o Imperador do Brasil. Aproveito a oportunidade para encorajar historiadores e estudiosos a explorar e estudar esses documentos inestimáveis.

 

 

  • Existe algum projeto para estudantes brasileiros estudarem na Argélia?

 

Infelizmente, a cooperação cultural e científica entre os dois países não se adequa ao nível de excelência desta relação em outros aspectos. E é uma constatação que deploramos dado o grande potencial de ambos os países. A pequena troca entre universidades, centros de pesquisa, centros religiosos… deve ser compensado pela concepção de mecanismos adequados para remediar esta situação, mesmo que a situação econômica dos dois países não permita, por enquanto, a implementação de projetos muito ambiciosos.

A este respeito, deve-se lembrar que, em 2013, a Embaixada organizou a semana cultural da Argélia no Brasil (Brasília e São Paulo), o primeiro evento desse tipo, em que divulgou e promoveu o patrimônio cultural do nosso país que é conhecido especialmente na classe intelectual (acadêmicos, professores, funcionários públicos …).

Não poderia terminar este ponto sem contar-lhe dos dois eventos que marcaram as relações entre os dois países, durante o ano de 2014 e 2016. A participação da Argélia na Copa do Mundo de 2014 e nos Jogos Olímpicos do Rio 2016.

Esses eventos esportivos, em particular o futebol, planetários nos deram a oportunidade de descobrir e apreciar a hospitalidade e a bondade do povo brasileiro, caloroso e amigável. Os muitos argelinos que permaneceram no Brasil para apoiar sua equipe nacional voltaram com lembranças e imagens indeléveis desse belo país que é o Brasil.

E deixe-me compartilhar com você uma confidencia. Continuo convencido de que a brilhante trajetória da nossa Seleção Nacional na Copa do Mundo se deve, em parte, à amizade e encorajamento do povo brasileiro. Neste contexto, gostaria de expressar meus sinceros agradecimentos.

 

  • Quais os produtos o Brasil importa da Argélia e quais os produtos o Brasil exporta?

 

 

Tanto o Brasil quanto a Argélia possuem enormes potencialidades que estão apenas esperando para serem identificadas e exploradas. Até agora, nosso país ocupa o segundo lugar entre os parceiros do Brasil no mundo árabe e no continente africano.

 

O comércio entre os dois países atingiu US $ 2.684.135,74 em 2016; dos quais US $ 1.063.291.829 de exportações brasileiras para a Argélia (queda de 3,08% em relação a 2015) e US $ 1.620.843.921 de exportações argelinas para o Brasil (19,77%). A balança comercial, portanto, continua a ser favorável para o nosso país.

 

Em 2015, o volume de comercio atingiu 2. 806.109.070 USD (993.045.770 USD de exportações brasileiras, queda de 13,83% em relação a 2014 e 1.813.063.300 USD de exportações argelinas, queda de 37,87%).

 

Exportações para a Argélia (% de comércio % Importações % de comércio): Matérias-primas (açúcar, milho, café, leite em pó, carne vermelha e óleo de soja): 15,5%, Produtos semimanufaturados: 78,3%, Produtos manufacturados: 6,2%

 

Importações provenientes da Argélia (% de comércio % Importações % de comércio): Matérias-primas: 31,4%, Produtos manufacturados: 68,6%

 

Os principais produtos argelinos exportados são hidrocarbonetos e seus derivados (nafta, petróleo bruto, propano liquefeito …), bem como fosfato e cimento.

 

A empresa argelina Cevital planeja investir nos setores de produção e refinação de produtos agrícolas (soja, milho, açúcar, etanol proveniente do milho), construção de linhas ferroviárias e quatro terminais fluviais e portuários. Prevê-se a construção de parques agroindustriais. A Cevital também possui silos de armazenamento de grãos para exportação. Além disso, a Cevital concluiu com a mineradora brasileira Vale a compra de uma usina siderúrgica em Maraba (Pará). Esta fábrica será a primeira na América Latina a produzir trilhos ferroviários. A Cevital garantirá a transferência de tecnologia nesta área.

 

Na Argélia, existem duas principais empresas brasileiras: a Randon (equipamentos automotivos e relacionados) e a construtora Andrade Gutierrez. Deve-se notar que o grande viaduto Trans-Rhumel em Constantine, construído pela empresa brasileira ANDRADE GUTIERREZ, foi inaugurado em 2014.

 

 

  • Fique a vontade para explicar aos nossos leitores sobre as relações e expectativas futuras entre Brasil e Argélia e também sobre as obras de Oscar Niemeyer no seu país.

 

 

A Argélia foi um dos primeiros países em que o Brasil propôs um projeto de Memorando de Entendimento sobre Promoção e Facilitação de Comércio e Investimento. O projeto está em exame. Além disso, um projeto de cooperação sobre a transferência de conhecimento para a produção de pedras preciosas, joalharia e artesanato mineral foi fechado recentemente. Este projeto envolveu cursos de treinamento na Argélia e no Brasil. No campo da saúde, deve-se notar o acordo de treinamento técnico em cirurgia cardíaca pediátrica e o projeto de gestão e padronização do manejo de pacientes com queimaduras.

 

Apesar do muito bom nível de cooperação entre dois países-chave nas respectivas regiões, deve-se notar que a parceria bilateral se beneficiaria ao ser fortalecida e consolidada, especialmente entre empresários de ambos os países, tendo em vista o potencial existente e a excelência das relações bilaterais. E isso particularmente através do estabelecimento de um novo, mais inovador e pró-ativo quadro de cooperação.

 

As forças econômicas dos dois países, combinadas com a boa vontade política comum, não deixarão de convergir para a abertura de um novo e mais amplo campo de cooperação bilateral. De qualquer forma, as perspectivas de nossas relações bilaterais são promissoras, sabendo que, de ambos os lados, está emergindo uma consciência da necessidade de uma revitalização da nossa cooperação.

Com 600 trabalhos em uma carreira de 70 anos, o grande arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer deixou sua marca em todo o mundo, incluindo a Argélia. Com a mais profunda simpatia do presidente argelino da época, senhor Houari Boumediene (1965-1978), Oscar Niemeyer desenhou vários edifícios na Argélia, incluindo a Universidade de Mentouri em Constantine, a sala omnisport do complexo olímpico (a cúpula do 5 de julho), a Escola Politécnica de Arquitetura e Urbanismo de Argel e a Universidade de Ciências e Tecnologias de Argel. Ele também concebeu o projeto de uma mesquita na água, no porto de Argel, bem como um centro administrativo. Além disso, a foto do projeto da mesquita imaginada pelo arquiteto em 1961 na Baía de Argel apareceu na capa da revista na publicação da revista Nosso Caminho, que o mesmo dirigia (dezembro de 2011).

Para homenagear o grande arquiteto e amigo da Argélia, em julho passado, a Embaixada  da Argélia em Brasília, em colaboração com o DF e a UNB, organizou em Brasília, uma exposição retrospectiva do seu trabalho.

O arquiteto parece ter sido seduzido pela Argélia. Um país que o recebeu de braços abertos enquanto estava exilado do Brasil na década de 1970. Em um artigo publicado em 2006 no jornal argelino El Watan, Oscar Niemeyer explicou seu amor por um país que conseguiu arrancar sua independência após séculos de colonização. O arquiteto diz que chegou à Argélia “no momento certo, depois da vitória contra a colonização. Havia muita felicidade, alegria e uma certa gravidade.  ‘’Encontrei a melhor solidariedade. Eu amei este país, mantive grande  afeição. ” afirmou.

O Presidente argelino Sr. Abdelaziz Bouteflika prestou homenagem a Niemeyer dizendo ‘’ Oscar Niemeyer nos deixou depois de um século de vida que ele passou, maravilhou-nos com suas obras em todo o mundo. Ele era brasileiro por nacionalidade, mas universal pelo talento, pelo reconhecimento e pela estatura. Ele foi durante mais de uma década, argelino pelo seu amor por nosso país que soube acolhê -lo no mais alto nível, dando-lhe a oportunidade de desenvolver a sua obra argelina. A este grande amante das curvas e da brancura, quero hoje prestar homenagem.’’

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Fabiana Ceyhan

Jornalista por formação, Professora de Inglês (TEFL, Teaching English as a Foreigner Language). Estudou Media Studies na Goldsmiths University Of London e tem vasta experiência como Jornalista da área internacional, tradutora e professora de Inglês. Poliglota, já acompanhou a visita de vários presidentes estrangeiros ao Brasil. Morou e trabalhou 15 anos fora do país.